domingo, 28 de fevereiro de 2010

Da genialidade das coisas simples

     A grande resposta, a grande descoberta, a grande idéia, o grande plano... Estaria mesmo lá fora o que podemos encontar aqui? Preciso mesmo importar o alheio para contemplar o que me falta? Estão em mim as perguntas (e essas me valem mais que as respostas) e não lá fora, onde equivocadamente procuro.


     Cresci rindo da lógica silvícola ao trocarem tesouros por espelhos. No entanto, diante da imagem de minha incessante barba por fazer, no espelho do banheiro, ao ver um rosto que aprendi a chamar de meu, tive a epifania que os índios(os quais eu julgava tolos) tiveram há cinco séculos. Um espelho nos dá o maior tesouro do mundo: nós mesmos! A imagem refletida em um instante de auto-conhecimento em que os olhos só alcançam aquilo que somos.

     Eu por meus olhos. A obra de arte que nenhum pintor será capaz de conceber. Apenas meus olhos e os meus três graus de hipermetropia e astigmatismo podem me conceder. Algum reconhecimento nisso? Algum mérito em ver que sou eu mesmo?

     Da barba que não desiste de crescer ao cabelo que insiste em cair, eu vejo mais que a embalagem e até pergunto por que não me destaco na prateleira. Talvez por ser preciso que as pessoas me leiam amiúde, nas entrelinhas miúdas do meu rótulo deve ter minha composição e algumas instruções como manter longe de crianças e animais. No entanto, a lógica ainda favorece as embalagens maiores e mais chamativas(eu pensei apelativas?): “-Ah, vou pegar aquele maior com o frasco amarelo, que depois de usar eu posso aproveitar a embalagem que é tão bonitinha!” E eu lá na prateleira sem grana para um “merchandising” no horário nobre do dia de quem eu quero que queira o meu querer.  

     Nesse ponto, o índio é genial. (Além de andar nu, claro.)  Com um espelho ele ganha a possibilidade de desfrutar da companhia dele mesmo. O alheio lhe é indiferente. Ele tem diante de si um infinito de possibilidades a serem consideradas antes mesmo de ser preciso olhar para o lado. Os portugueses descobrindo um novo continente e o índio descobrindo um novo mundo.  Queria não ser “civilizado” e ter da mesma burrice indígena; aproveitar a companhia de alguém que (me) escreve todos os dias, faz piadas sobre tudo (mesmo que eu seja a única pessoa a rir) tudo“Tem computador e rede, rede para dois, gosta de eletrodomésticos, toca piano e violão...”[1] e encontra sempre uma forma plural de dar espaço às criatividades e de expressar mais do que qualquer segredo guardaria. Mas não, insisto em ficar procurando minha imagem no espelho alheio...



(...)



[1]  “Gerânio”, Marisa Monte.












segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A solidão é um bem a ser cultivado...

     Da arte de estar sozinho, aprendo eu , comigo, no universo entre uma palavra minha e a escuta em silêncio de um alheio que sou eu de uma perspectiva diferente. Cultura de solidão, raízes no ar, sementes em mim, flores sem espinhos e caminhos sem fim. A eternidade se esconde na solidão das pequenas coisas.
     Os tons que se harmonizam no silêncio, as cores que concordam no escuro, as idéias que se encontram na solidão. É mais que espaço, é expansão. Liberdade escrita como verbo que conjuga a vida à luz da regência de um estado de plenitude. O encontro consigo mesmo como o encontro com a cara metade.   
     Os grandes livros, as grandes sinfonias... A imortalidade reside a duas quadras da solidão. A chave para dividir-se com o mundo está em concentrar-se em si mesmo. Não se trata de egoísmo ou misantropia, mas quem sabe, um altruísmo extremo ao construir nos espaços da solidão aquilo que pode dar sentido aos adjetivos belo ou genial. A escrita é artesanal. Não conheço arrendamento de palavras, conheço plágio e citação. É preciso reconhecer o monólito em uma idéia, sentimento, experiência e saber esculpir as palavras que ganharam um novo sentido à cada novo leitor. Leitura se faz sozinho, televisão se assiste em grupo. Solidão é vida, criação. A dúvida surge em silêncio, as respostas se ouvem em coros.
     O tempo que se passa sozinho é aprendizado, é como ter a possibilidade de se colocar a existência diante de um espelho. Não que a companhia das multidões e um milhão de amigos(para cada um me dar um real) seja uma coisa ruim. O fato é que família, amigos e amores ajudam na “caminhada da vida”. No entanto, a solidão é asas para uma vida livre. Dívidas só com a superação de si e dúvidas que não demandam respostas por imperativos alheios. É centrar-se e ter novas diretrizes para um horizonte construído à cada novo sonho. Solidão comporta todo o entendimento. É preciso estar em paz consigo mesmo para ousar um acordo com o mundo. Paz no sentido de harmonia, porque a guerra é ímpeto de movimento e este abre portas para a superação de paradigmas e portanto, crescimento.








quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Sobre a(s) “desimportância(s)”...













    Por considerar grande parte das coisas desimportantes, aprendi a descobrir o que realmente poderia agregar alguma importância. Aquilo que não precisava ser definido como importante para ser importante. Não era a coisa em si, mas a forma como ela me chegava. Nunca me disseram que uma folha em branco e um lápis eram especiais. No entanto, um PC já nascia com a promessa de mudar sua vida. Nenhum saudosismo às falecidas “Olivetti”, mas a escrita artesanal por si só se faz importante.
         
         Dizer não para a terceira pessoa do plural é um exercício diário. Eu quero as minhas escolhas ratificadas e retificadas por mim. A indiferença pela dor alheia, nesse ensejo, poderia ser mútua. Ser menos humano é um benefício para o progresso da humanidade. Definhar é ceder espaço ao alheio mais forte  e não usurpar o espaço de outrem conquistado pela força. O peso dos fracos não deveria cair como um pesar para os fortes. Fazer da necessidade um mote para a criação, da fraqueza força, como aqueles que fizeram da solidão música, que da folha em silêncio criaram poesia, que diante do medo escreveram a coragem, que diante da ausência inventaram a saudade... 














segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010









A existência é, por essência, miserável...











segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Alheio




À saudade que
me traz você
em meus sonhos
que faz da falta
de você em mim
um conto
ou uma versão
do poema
da paixão de ontem
vivida hoje em mim
(enquanto fecho os olhos)




terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Rebordosa (ou o poeta do silêncio)





O poeta do silêncio
ele me pertence
ou é posse minha?
Quando se confunde
o lado de dentro
com o de fora
com as portas abertas
janelas fechadas importam?

O não faz mais sentido
para quem sempre ouviu o sim
Fome não é ausência
por aqui,
é ímpeto de movimento
é um passo à frente
para deixar o futuro para trás

Às vezes, até me vem
achar que o saudável
é ter saudade
que o saudável
como uma rebordosa positiva
como um efeito colateral do que foi bom
sem mesmo fazer bem ou mal
apenas por ter um ponto final
e fica a saudade alentando a esperança
por uma reticências

Se me pudesse reescrever
cobriria à caneta esses rascunhos de lápis
Nem mesmo pintaria mais flores
(para não ter mais espinhos)
ou desenharia mais sorrisos
(para não ter que esconder tantas lágrimas)