quinta-feira, 4 de novembro de 2010

"1mano"

    


     Seria este o adjetivo humano a antítese inerente a nossa existência? O mesmo a nos divinizar com o mérito de nossa criatividade e a nos justificar pelo fracasso de nossas criações.

     A palavra “humano” que demanda ser atualizada à cada contexto social, histórico e temporal. Em um mosaico polifônico de sentidos que não comportam ainda a totalidade do (que é) ser humano.

     Das construções indefinidas de si às estruturas pré-concebidas do alheio se faz presente o humano. Ao tomar o indivíduo como centro das discussões e ao destroná-lo do centro do universo[1] em prol da coletividade. Não obstante, falar sobre o indivíduo é negá-lo. Sob a pretensão de ser universal, ou mesmo imortal para os que se escrevem mais descolados da realidade, se aniquila o indivíduo trucidando o que lhe houver de mais ímpar(primo ou singular) para viabilizar a existência de um denominador comum, muitas vezes mais próximo do surreal que do verossímil.

     Seja o direito, o certo, o bem, o bom ( e seus sensos e sentidos), não se encontra proposição que não advinda de uma preposição. As visões de mundo traduzem visões de si elevadas a enésima potência. A empatia é um recurso argumentativo-retórico que ao supostamente colocar-se na condição do outro nega-lhe a possibilidade de discordar, o que implicaria soar dissonante com si mesmo. “Transvestida”, não poucas vezes, de altruísmo, fraternidade ou algum elemento valorado como superior, a empatia constrói-se como fundamento para a arte de se ter sempre razão. Uma afirmação de si legitimada pelo olhar do outro que me vê sob meus olhos. Uma vez que é impossível sentar-se no “trono” da alteridade, não vislumbro nesse momento quaisquer argumentos que não corroborem tais proposições sobre a relação empática. Ratifico que a empatia é um recurso para se manter a posse da razão. Ao simular a posição do outro “transvisto” minha posição como alheia retificando os inconvenientes argumentativos e consolidando a razão como posse minha.

     Ah, a didática, as parábolas, as alegorias, às metáforas... ode ao subentendido e suas orgias com as entrelinhas...
“-Calma, não é o que você está pensando!” Que inversão da situação de berlinda! A vítima agora é algoz! Ao ter plena ciência do meu feito desloco-me para o ponto de observação do outro com a prepotência de prever seus pensamentos e absolver-me antes de qualquer acusação e julgamento sobre meu feitio. No entanto. A defesa sem ataque manifesto é mais que confissão, é condenação. O meu olhar sob os olhos alheios diz mais de mim que do outro.

     Ainda há acordos tácitos sendo assinados no “arrepio” de nossas consciências , enquanto os “homens” dormem, os “humanos” fazem a festa. Os valores acordados pelos homens como nobres ganham licenças poéticas no instante em que todas as cores combinam, quando todos os gatos são pardos, na penumbra da percepção, consegue-se a carta de alforria para o impraticável, quando tudo que ainda não foi proibido é permitido.
     O efeito etílico, o efeito de grupo, os entorpecentes do espírito e do corpo, as religiões, as excludentes, os excluídos, os direitos humanos para os que optam por caminhos tortos e as “humanizações” de que se valem os meninos quando tentam se passar por homens.

     Transformar isso em algo concreto é transtornar estruturas frágeis, mas já consolidadas há tanto. Seria leviano privá-los do pouco que têm. A indiferença, por mais que soe como omissão aos ouvidos mais afetados, ainda é um solvente universal. Humanizar relações muitas vezes implica tolerância com o intolerável[2]. É clichê ver a evocação da “Liga da justiça dos Direitos Humanos” para a proteção dos animais que estão na iminência de serem sacrificados. Quiçá seja preciso doar um pouco de humanidade para os mais desumanos; nessas horas em que o herói(“Super-Humano”), sob os holofotes a iluminar seu altruísmo e fliantropia, doa poções de humanidade às porções mais desumanas da humanidade  Quisera que houvesse menos luz para que não ofuscados pudéssemos ver a culpa e o egoísmo procurando uma válvula de escape. No entanto, também seria possível a percepção do espelho, e Narciso continuaria aplaudindo, em uníssono com sua apatia, a sua empática televisão.
    


[1]  Outrora , quando os pais da ciência enfrentavam os santos, foi descartada a idéia de que o universo girava ao redor da Terra, agora o universo gira ao redor do homem segundo as cartas de pais de santos. (Eram os deuses astrológicos?)
[2]  “Um homem só senta à mesa com sua família ou seus amigos.”